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Mostrando postagens de maio, 2015

Problema do cão

Vento fresco e silêncio a passarinho - eis o prato servido pelas manhãs em Cabedelo. Mas há quarenta dias me mudei e agora são as de João Pessoa que me servem - suor no sovaco, buzina no ouvido. Vencida a quarentena, posso falar do que me vai pelos miolos. Aliás, comecei resmungando, mas quero avançar sorrindo. Em Cabedelo, fica-se refém do carro: nem tudo está ao alcance dos pés e as ruas são de tal forma quietas que se escondem e amedrontam. No Cabo Branco, há efervescência nas calçadas e um aluguel de bicicletas a dois quarteirões do meu abrigo. Coloquei o par de tênis pra trabalhar duro e até aposentaria o carro, não fosse o expediente a dar. Mas nem tudo é paradisíaco neste inferno de quase 40 graus. Apesar de gasta, a metáfora do inferno é necessária. Além do calor, há um problema do cão. Até agora, não se passou um dia sem que eu tenha botado os pés na rua sem topar com cachorros por todos os lados. Há os vadios, à espera de sacos de lixo por

O visitante chinês

Quase junho e a chuva só vem de passagem, o frio não manda recado, o inverno parece que não chega. Quem chegou por aqui foi o premiê chinês, trazendo a chave do cofre e posando para o retrato. Vibra o governo com a notícia de 50 bilhões de dólares, mas não vibram os analistas. A China não vem para ser parceira do Brasil, mas para cuidar de seus interesses geopolíticos - é o que dizem. E choram. Porque não construímos pontes e portos à velocidade da luz, porque a roda da história vai girando outra vez e não somos nós os preparados para assumir a liderança do mundo. Não sei se choro com eles por esses motivos, mas choro porque me dou conta de que, se é a China que vem para mandar no terreiro, vou ficando ainda mais ignorante do que supunha ser. Vejam vocês: só agora descobri que a China tem um premiê. Jiang Zemin, Hu Jintao, esses caras que apareciam nos livros escolares com caras de macho-alfa não podiam mais que a rainha da Inglaterra. Tudo be

Enfim, juntos

Há quem diga que a cidade mergulhou no caos; há quem diga que tudo não passou de pânico de classe média no WhatsApp; há quem diga que a culpa é de Ricardo, ou que já era assim no tempo de Cássio. Eu só digo que um dos ônibus foi queimado a menos de um quilômetro de onde moram minha mãe e minha irmã mais nova, o que foi suficiente para me deixar menos cético e mais preocupado. Mas também há quem diga que a culpa está nas relações espúrias entre a bandidagem legal (nas casas legislativas, nos palácios de governo, nos quartéis de polícia) e a ilícita (nas células do crime organizado). Não duvido, como não duvido do desespero de quem diz que bandido bom é bandido morto. Mas os bandidos se matam entre si todos os dias, no entanto continuam a proliferar como mosquitos em epidemia. Por isso eu digo que bandido bom era o bandido de antigamente. No século passado, tive dois encontros com o tipo. Superado o susto e corrido o tempo, guardo deles ternas recordações. No

Com que causa eu vou

 Uma visita ao Facebook, duas ou três clicadas nos portais - e já se tem um balaio transbordando de boas causas a que dedicar a vida, o texto ou a conta bancária. Mas anteontem recebi a edição n. 19 da serrote, ontem li o ensaio de John Jeremiah Sullivan sobre o ensaio e fiquei com algumas palavras urgentes a dizer sobre um e outra. Interessante a sugestão de Sullivan: a França pariu o ensaio, mas a Inglaterra criou o ensaísta. Sua partida: os Essayes of a Prentise, de James I. Sua trilha: George Buchanan, mestre de Montaigne e do rei. Ainda mais interessante o desdobramento da argumentação: cada qual deu partida ao ensaio em uma acepção própria, ainda que próximas - exame (no caso do francês), aprendizado (no caso do inglês). O texto não é conclusivo e a prosa é para degustação, como convém ao gênero. Não sei se a idéia de Sullivan é original, mas é nova para mim: pesar e tentar não querem dizer a mesma coisa na torre do ensaio. Nos próximos