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Mostrando postagens de outubro, 2015

É só uma turma aí fazendo outro filme

A semana começou em eleição e terminou em literatura, por isso mesmo o Festival Internacional de Autores parece não ter outro assunto: política. Tudo bem, exagerei; ainda é o terceiro dia e eu só fui a duas de dezenove mesas e papos. Pingo no i, portanto. Steven Pinker veio na quinta pra conversar com Ken Dryden sobre cérebro, escrita e violência; terminou entrando na eleição canadense quando um ouvinte perguntou: por que os adversários são tão agressivos no debate político? Porque não se mobilizam militantes com ponderação. – respondeu Pinker. E deu sarna pra quem coçou: por quanto tempo você ficaria vendo um jornal que noticiasse apenas que tudo está em paz e dentro da mais absoluta normalidade?  Políticos precisam do ringue, como jornalistas do desastre. Ontem, vieram Sara Winman, Tim Conley e Jillian Tamaki (olá, prazer conhecê-los!) pra discutir fantasia e realidade na literatura do século XXI. Tim Conley começou fazendo piada: qual a diferença

Diga a eles que sejam menos rudes

(Ou: recado aos ladrões de Campina Grande, da Paraíba, do Brasil) Dias desses, descendo a Rue Saint-Urbain a caminho da Sainte-Catherine, topei com uma das muitas figuras que fazem Montréal bater Toronto em matéria de - por que não armar a barraca aqui?  "Muito feio para a prostituição. Esmola, por favor." - lia-se no cartaz ao lado da caneca em que o rapaz, certamente no vigor dos seus trinta e poucos anos, esperava ganhar o pão do dia. Cheguei perto, pedi licença, soltei a língua. Que ele estava pessimista: barba feita, perfume passado e roupas bacanas no corpo malhado, poderia viver com menos dureza e mais prazer. E ele, na bucha: mas aí teria que mudar o texto para 'muito cristão para a prostituição etc. e tal' e me pediu ele a licença, que eu estava lhe atrapalhando o negócio. Pardon, Pardon! Ça va. Aí é que tá. Em Toronto, os mendigos são menos artistas e mais operadores de telemarketing. Ontem mesmo, falei com um em Dundas Squa

Minha vesícula não cooperou

De tudo o que tenho tentado sem sucesso algum conhecer, a Música salta aos ouvidos como o que há de mais difícil, depois da Física, de fazer passar dos sentidos aos circuitos da razão. Uns relampejos aqui, umas trovoadas ali, e a História da Música Ocidental de Otto Maria Carpeaux continua acolá tão introdutória e tão despojada, mas tão inacessível a estes miolos tão moles. Nem falo de outras e mais técnicas tentativas, que humilhação grande se disfarça. Vejam este exemplo. Outro dia, voltei pra casa com um álbum em três cedês de Ytzhak Perlman na bolsa. Sim, ainda compro cedês; e sem culpa. Ao contrário, alegro-me por contribuir com dois ou três tostões para que um artista não tenha de ganhar a vida num tribunal pé-no-saco de justiça. Lá dentro, no encarte, certo Mr. Shapiro apresenta o tal Perlam Sound como "lustrous, warm, generous". Arranho o cedê e sinto as cordas cintilarem, mas não sei explicar como nem por quê... ... muito menos sa

Pelo menos é bonito

O Primeiro-ministro solicitou e o Governador-geral dissolveu o Parlamento em nome de Sua Majestade a Rainha da Inglaterra. Eleições em outubro, debates em curso e um escândalo nos jornais. Dois anos atrás, o Senador Mike Duffy foi descoberto recebendo auxílio-moradia para desempenhar o mandato na capital quando, na verdade, tinha casa própria em Ottawa. Teve que devolver o dinheiro. Mas, como não tinha recursos, quem pagou a conta foi Nigel Wright. Rapaz rico e generoso, Mr. Wright era Chefe de Gabinete do Primeiro-ministro e, sem contar nada ao patrão, tirou a grana do bolso. Bagatela: 90 mil dólares canadenses. A operação foi descoberta, Mr. Wright caiu porque o dinheiro não fora declarado e Mr. Duffy foi processado por fraude aos cofres públicos. O processo ainda corre na Justiça e chegou a hora dos depoimentos. Mr. Wright invocou os Santos Evangelhos para justificar seu ato de caridade, admitiu que pagou contas semelhantes de muito mais gente